Através de uma longa carta enviada por e-mail aos seus fãs, Lorde decidiu se abrir publicamente a respeito de uma série de questões que vem enfrentando em sua intimidade. De maneira aberta, a neozelandeza falou sobre como vem sofrendo com uma desilusão amorosa, sobre a série de doenças que vem enfrentando e episódios que indicam momentos de depressão, mesmo que esteja em um bom momento de sua carreira, e revelou uma experiência com cogumelos alucinógenose, de como eles a ajudaram a entender melhor o seu corpo e o mundo ao seu redor.

Lorde diz que às vezes fica cansada de si mesma e mostra sinceridade quando revela que decidiu não ir à semana de moda em Paris, por ter prometido, ainda no começo de sua carreira, "que nunca seria uma das pessoas sorridentes se não fosse real."
Lorde

Mesmo com os problemas, a cantora revela otimismo com o presente e o futuro. A artista entende que 2023 foi o ano em que ela definitivamente fez a transição da primeira década de sua carreira, começada quando ela tinha apenas 16 anos, para a que virá em seguida.

Ela também se mostra satisfeita com a pequena série de shows que fez em agosto em alguns festivais europeus, realizados já depois do fim oficial da turnê de divulgação de seu terceiro álbum, "Solar Power", lançado em 2021.

Leia a íntegra da carta:
Lorde

"Acabei de escrever uma longa carta para vocês contando como estou. Ela terminava perfeitamente, amarrada com um lacinho. Escolhi bem as palavras, mas não disse a verdade. Então vou começar de novo, vou digitar e não olhar para trás, e enviar o que sair.

Estou em Londres, estou por aqui desde maio. As coisas parecem claras. Não vi muitos amigos; Principalmente, estou sozinha com meus pensamentos. Eu nado, vou para o trabalho, volto para casa à pé ou pego o trem, faço as refeições na minha cozinha e vou para a cama pensando no que estou fazendo. Estou começando a sentir falta dos meus amigos e familiares, como uma vitamina da qual tenho deficiência. Em breve, voltarei para Nova York e depois para casa.

Estou vivendo com o coração partido novamente. É diferente, mas igual. Dói o tempo todo, esqueço o porquê e depois me lembro. Não estou tentando me esconder da dor, entendo agora que a dor não é algo para se esconder, que há realmente uma grande beleza em acompanhá-la. Mas às vezes fico cansada de estar comigo mesma. Eu como chocolate para tentar manipular as endorfinas, trazer de volta a doce felicidade da manhã de Páscoa. Sento-me na máquina do tempo e espero que ela se mova, mas ela ainda não foi inventada.

Meu corpo está muito inflamado, está tentando me dizer alguma coisa e eu tento aguentar, mas nada parece ajudar e fico frustrada. Meu intestino não está funcionando bem, minha pele está pior do que nunca, já fiquei doente meia dúzia de vezes. Percebi no início deste ano que ouvir meu corpo é difícil para mim, é algo que nunca aprendi a fazer. Venho tentando me ensinar a fazer isso este ano, mas na verdade tem sido difícil, muito confrontador, e me deixou totalmente consciente de todas as vezes em que o ignorei ou não lhe dei o que era preciso, da vergonha da indecisão de encarar ou fugir disso, ou de pegar um punhado de comprimidos e mandar pra dentro. Aquela pequena pílula amarela que sempre tomei logo cedo durante milhares de manhãs desde os 15 anos, eu parei de tomá-las há cinco dias. Vamos ver como será.

Eu entro na internet e olho para todo mundo. Pessoas lindas cantam para mim. Todo mundo ficou muito bom nessas mesmas coisas. Olho para costas arqueadas, sorrisos entusiasmados, bolsa certa, óculos de sol certos. Eu me pergunto se é tão bom quanto parece, já faz muito tempo desde quando escolhi a melhor foto entre centenas, que a mirei, como se colocasse uma flecha no arco, e disparei. Todo mundo parece muito magro. Só de pensar nisso me sinto cansada e distante. Não tenho certeza se isso está afetando mais alguém. Continuo gastando dinheiro, me perguntando se o que está no pacote fará eu me sentir bem, mas acho que compro as coisas erradas. Eu queria ir para a semana de moda de Paris, tinha todos esses grandes planos, mas esta semana mandei uma mensagem para meu empresário e desisti. No início da minha carreira prometi a mim mesma que nunca seria uma das pessoas sorridentes se não fosse real.

No início deste ano, comi dois punhados de cogumelos, doses sólidas com gosto de terra verde. Recebi muitas informações sobre o que meu corpo passou até agora, o que ele precisava, onde Deus estava e onde Deus não estava; Senti profundamente como é desestabilizador sair de casa e começar uma nova vida do jeito que fiz. Vi também que meu corpo é completamente magnífico e que odiá-lo é tão fútil quanto odiar uma árvore; que eu realmente amo meu trabalho e que minha vida é como uma linda tapeçaria, e cada centímetro dela é precioso e tem significado.

Pode parecer engraçado ou fácil de esquecer, mas faço discos porque preciso. As músicas são feitiços; um feitiço para desabafar algo, um feitiço para destrancar uma porta. Cada vez que coloco no papel algo em palavras exatamente como vejo, e combino com a música certa, um nó se solta em mim. Mas também dói enfrentar esses nós. Já fiz gravações em número suficiente para saber que essa sensação de minha pele se descolando faz parte disso. Eu sei que me lembrarei deste ano com carinho e um pouco de admiração, sabendo que foi o ano em que tudo se alinhou, o ano em que fiz a transição da década de trabalho de minha infância para a que vem a seguir - uma que mesmo com tudo isso, estou tão animada. Só é difícil quando você está bem no centro da coisa.

Então, nesse estado, fiz uma curta turnê em festivais europeus. Construímos uma nova versão legal do show em alguns dias. Foi bom mudar de marcha e sair da minha cabeça. Eu me esforcei no show, mudando o setlist e os arranjos, foi legal como vocês perceberam, e foi bom dançar as novas versões com vocês, olhando para vocês, todos suados com seus amigos, todos na mesma vibração. Eu senti a pulsação da história que está sob essas músicas agora, de como cada ano faz com que essas músicas pareçam mais peças escritas e cantadas coletivamente. Deixei meu corpo e me fundi com os seus e foi um êxtase. Depois fui para casa, para um hotel focado em receber viajantes a negócios, e me lavei para tirar o brilho e a fumaça do cabelo."