Por Leandro Saueia
Captain Beefheart
Captain Beefheart Captain Beefheart em 1974 (Foto: Reprodução Wikipedia)
Don Van Vliet ou o Captain Beefheart deixou o planeta na última sexta-feira. Na verdade para seus fãs era como se ele já estivesse morto há muito mais tempo já que desde 1982 ele havia abandonado a carreira musical para se dedicar apenas às artes plásticas.

É possível que você jamais tenha ouvido algo dele. Primeiro porque ele nunca foi popular, segundo porque seus discos nunca saíram no Brasil e terceiro porque a música dele quase sempre desafia os limites harmônicos, melódicos e estruturais do que se convencionou chamar de música.

Pegue por exemplo seu disco mais celebrado "Trout Mask Replica"de 1969, eleito entre os 100 melhores de todos os tempos pela revista Rolling Stone. Provavelmente nenhum disco dos tais "clássicos do rock" exige tanto do ouvinte. Em seus quase oitenta minutos a impressão que se tem é que ninguém na banda está se entendendo. Mas tudo ali foi milimetricamente calculado e ensaiado à exaustão antes de Vliet e a Magic Band irem para o estúdio. Segundo consta as vozes do disco foram gravadas sem o uso de fone de ouvido para escutar o instrumental das canções.

Também consta que ele usou e abusou de sua banda. Músicos contam histórias assustadoras de tortura psicológica ou terror puro e simples em cima deles. O baixista Jeff Cotton (ou Antennae Jimmy Semens) falou de períodos forçados sem sono ou comida e que Vliet tinha a clara intenção de quebrar o estado mental deles. Cotton deixou a banda em 1970 após uma "conversa em grupo" lhe render uma costela quebrada, uma "cortesia" do baterista temporário Jeff Bruschell.

Como era de se esperar tal método resultou em um disco caótico mas fascinante e que obviamente caiu no agrado de músicos experimentais e alternativos de diversas épocas. No pós-punk especilamente era possível ouvir muito dele nos trabalhos de bandas como Pere Ubu ou Devo. Muita gente também soube se inspirar nos experimentos dele para criar trabalhos mais pop. Os Red Hot Chilli Peppers por exemplo são grandes fãs.
DivulgaçãoCaptain Beefheart letras

Para quem lê em inglês vale a pena conferir esse divertido texto em que o jornalista John Harris do "The Guardian" tenta escutar o disco até o fim, entrevistando famosos fãs do álbum e dando as suas impressões a cada audição.

Mas nem só de cacofonia se fez a lenda de Beefheart. Seu primeiro disco "Safe as Milk" de 1967 por exemplo é um ótimo disco de blues rock que agradará tanto aos fãs dos Rolling Stones quanto dos White Stripes. Álbuns como "Clear Spot" ou "Doc. at The radar Station" também são razoavlemente acessíveis.

Em 1982 Beefheart abandonou a carreira musical. Desde então ele se isolou e passou o resto de sua vida sem dar entrevistas ou voltar aos estúdios se dedicando à pintura. Desde o início dos anos 90 ele sofria com a esclerose múltipla e viva em uma cadeira de rodas. Sexta-feira pouco antes de completar 70 anos ele nos deixou. Já sua obra obviamente continuará conosco e suas histórias excentricidades também continuarão a gerar fascínio o bastante para que el se torne imortal.

Ouça aqui o capitão em dois momentos distintos

Em fase mais "convencional"


E em outra (bem) mais amalucada