O frio que te deu, amor Eu mesmo que assoprei Dos mares que cruzei, amor Eu trago vento e Deus
Eu trago a chuva forte, amor Nos pulmões carregados E nos olhos tão cansados, amor Vigio o eterno Norte Trago a chuva Vento e Deus
As mãos que agora tocas, amor Beijavam cordas brutas E não sei se escutas, amor O odor que delas brota O peito em que descansas, amor Era todo de ferrugem E ainda hoje ruge, amor O sal de muitas rotas
Trago os olhos salgados De um mar velho e arredio E trago no peito tardio Demônios e tornados O copo entornado Gemia seus balidos E eu com os olhos menos garridos Orava ao vento e Deus
Minha vela não tem pavio São mil fios costurados E no alto só há pecados E não luz lambendo o fio Minha vela bebe os ventos E não tem medo de apagadas Só das chuvas amargadas E de braços desatentos Minha vela não clareia Nem perdoa quem a queima Só sentencia com quem teima Aos infernos e às sereias
Minha vela não tem santos Só fodidos e pernetas Só esquálidos capetas Cujas rezas são os prantos Minha vela não vai ao peito De pobrinhos falecidos Mas é ela quem leva os desvalidos Homens ao eterno leito Não é com ela que se enterra Vidas alheias em valas fundas São nossas vidas moribundas Que ela com as próprias mãos encerra