Cristina Branco

O Enjeitado

Cristina Branco




No fundo, sinto-me apodrecer.
Agora sei onde e de quĂȘ irei morrer:
À beira do Tejo, de suas margens
macilentas e inclinadas.
Nada Ă© mais belo e triste
E a existĂȘncia sublime e lenta.

De tarde vagueio pelos prados
E à noite ouço o queixume dos fados
Até romper a madrugada.
- “A vida Ă© imensa tristura” -
E logo sinto as amarras desse mal
Que no tempo aguarda fatal.

SĂŁo as varinas quem canta o fado
E os entes que jĂĄ nada esperam.
-“Mais um copo pra esquecer”-
Deixam-no desamparado,
Ecoando por becos e vielas,
Num silĂȘncio que consente.

Um deles ouvi cantar
E minha frieza tornou-se em pesar:
“Nada me consola alĂ©m da dor.
A vida nĂŁo conhece o perdĂŁo,
Mais nĂŁo tenho que este meu fado
P’ra me encher a noite, sem amor.”

No fundo, sinto-me apodrecer;
Aqui, de nada serve morrer,
Onde tudo se perde na volĂșpia da dor:
Lisboa, outrora cidade das cidades,
Arrasta o passado no presente,
E vĂȘ nas ruĂ­nas uma glĂłria que mente.

Por essa miragem me encantei;
Também eu descobri e conquistei,
Para afinal, de tudo ser perdedor
Morrendo na lentidĂŁo da corrente,
Junto Ă  campa do mais nobre
Dos sonhos: “tudo Ă© dor”.







Composição: (j.slauerhoff - Custódio Castelo)

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